Muito se fala sobre tendências e transformações no marketing B2B. Mas, na prática, quatro temas do presente continuam emperrados: o uso da IA, a personalização real, a liderança de pensamento e a orquestração das ações.
Virar estas páginas é estar pronto para atingir um nível avançado de eficiência e geração de resultados.
É sobre vencer esses quatro desafios que trata o episódio 56 do Conversa B2B. Para esse papo, Guilherme Sboarim e Giuliano Duccini recebem Simone Justinio, Diretora de Marketing da Delfia e curadora do livro Jornada Marketing B2B.
Confira, a seguir, o episódio completo ou siga a leitura para conferir os insights mais importantes!
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IA no marketing B2B: só tem valor se for humana
Mesmo com o avanço das ferramentas e o buzz do mercado, 68% das áreas de marketing ainda estão explorando ou testando aplicações da IA, enquanto 95% das empresas não conseguiram gerar impacto direto em receita a partir dessa tecnologia.
O fato é: mais do que saber usar ferramentas, o diferencial competitivo passa a ser saber o que fazer com elas e com qual propósito.
O uso da IA ainda é visto como um fim em si: gerar mais conteúdo, mais rápido, com menos esforço. Mas isso tem pouco valor se o resultado for apenas mais do mesmo com menos conexão.
O verdadeiro desafio está em treinar pessoas para comandar inteligências artificiais com senso crítico, visão de marca e clareza estratégica. Simone Justinio alerta: a IA pode ser excelente em sugerir estruturas, acelerar tarefas e sistematizar dados, mas jamais vai dominar o que diferencia uma marca — seu tom de voz, sua narrativa e sua humanidade.
Capacitar times para liderar agentes de IA é tão ou mais importante do que contratar novas tecnologias. E isso envolve:
- Definir o que é coerente com a identidade da marca;
- Criar diretrizes claras para treinar e calibrar agentes de IA internos;
- Desenvolver senso crítico para avaliar e ajustar o que é produzido por essas ferramentas.
Outro ponto crucial é não abrir mão da conexão. Simone destaca a importância de manter o tom humano em toda interação, mesmo quando mediada por IA, afinal, a conexão emocional ainda é o que gera confiança e constrói relacionamento no B2B.
E há um alerta importante: maior produtividade sem clareza estratégica gera apenas mais ruído. Se o briefing está desalinhado, o volume de conteúdo só agrava o problema. O marketing precisa garantir que o uso de IA esteja alinhado com objetivos reais, e não apenas preenchendo pipelines de conteúdo genérico.
Por fim, uma questão ética ganha relevância: como garantir integridade e autenticidade em um cenário em que múltiplas empresas usam as mesmas ferramentas e recebem respostas similares? É aqui que entra o papel da curadoria humana. O que você faz com a informação disponível é o que diferencia sua marca da concorrência.
IA é commodity. Consistência, visão única e contexto são ativos que ainda pertencem aos humanos.
👤 Personalização no B2B: promessa que virou buzzword
No discurso, a personalização é unanimidade no B2B: todos dizem entender seu valor. Mas, na prática, o que vemos é mais do mesmo com outro nome.
As iniciativas rotuladas como personalizadas, em sua maioria, são, na verdade, comunicações em massa com alguns campos variáveis. Não há real adequação de linguagem, canal, timing ou proposta de valor. Isso gera frustração tanto no comprador quanto na empresa, que investe em algo que não gera tração.
Segundo os dados discutidos no episódio, 60% dos profissionais admitem um uso ainda básico de personalização, o que escancara o abismo entre discurso e execução.
As causas são profundas:
- ICPs genéricos e personas superficiais, que não capturam o real contexto das contas;
- Falta de dados primários e sinais de intenção, que impedem decisões precisas;
- Processos engessados, que priorizam eficiência operacional em detrimento de relevância;
- Desalinhamento entre marketing, vendas e sucesso do cliente, o que gera abordagens desconectadas da realidade de cada conta.
A personalização real exige muito mais que tecnologia. Exige cultura, método e dados acionáveis. E é aqui que o Account-Based Marketing (ABM) se torna mais do que uma tática: ele vira um framework para viabilizar relevância com escala viável.
Mas vale o alerta: adotar ABM sem uma base de personalização consistente é mudar o rótulo, não o resultado. O ponto de partida passa por entender o timing, as dores, os contextos e os canais preferidos da conta e seus contatos.
A personalização no B2B não é sobre como você fala. É sobre o que você escolhe dizer – e para quem. Se essa escolha for rasa, o conteúdo será ignorado, por mais automatizado e “customizado” que pareça.
No fim, a pergunta-chave não é “como podemos personalizar mais?”, mas, sim:
“O que nos dá o direito de ter a atenção dessa pessoa neste exato momento?”
Se o marketing não consegue responder a isso, personalizar é apenas um exercício de vaidade.
🧠 Thought leadership: a diferença entre conteúdo e liderança
Há uma inflação de “autoridades” no LinkedIn. Em tempos de excesso de conteúdo, publicar com frequência virou sinônimo de liderança. Mas thought leadership não se mede em posts, se mede em impacto real na forma como o mercado pensa, decide e age.
Liderar pensamento significa ser capaz de:
- Enxergar e discutir mudanças, tendências e boas práticas relevantes;
- Ter um ponto de vista próprio e claro sobre como navegar nesses cenários;
- Guiar outros profissionais e empresas com argumentos consistentes, dados e vivência prática.
É justamente o oposto do que muitas marcas B2B oferecem ao mercado: conteúdos reativos, superficiais e autocentrados que pouco contribuem para o repertório de quem os consome.
Mais grave ainda: quando o conteúdo se torna repetitivo, genérico e indiferenciado, a empresa desperdiça o ativo mais valioso que possui: a atenção qualificada do seu público.
Construir autoridade no B2B exige método e intenção. Não basta “produzir mais”. É necessário ter/oferecer:
- Narrativas coerentes com o posicionamento da marca, que se conectem a tensões reais do mercado;
- Pontos de vista que tragam reflexão e não apenas validação do senso comum;
- Alinhamento editorial entre porta-vozes, marketing e produto, para sustentar autoridade com consistência.
A liderança de pensamento só se estabelece quando a marca se torna referência sobre um tema relevante para o seu público, o que leva tempo e exige profundidade e resiliência contra métricas de vaidade (likes, impressões, curtidas).
Uma estratégia válida para acelerar e fortalecer este processo é trazer para a linha de frente do marketing conteúdos produzidos e compartilhados pelas lideranças da empresa.
Essa humanização da visão única da empresa atrelada às experiências reais dos profissionais que a representam potencializa a conexão e confiança do público-alvo com a marca.
Neste contexto, canais proprietários da empresa e perfis destas lideranças no Linkedin são táticas essenciais para que estes conteúdos de liderança de pensamento alcancem, de forma orgânica, as personas-chaves para o seu negócio.
Em um cenário onde IA e automação permitem que qualquer um “publique”, o que separa líderes de seguidores é a capacidade de formular ideias originais, úteis e relevantes e sustentá-las ao longo do tempo.
🎯 Orquestração: o desafio invisível que mina o marketing
Entre todas as dores do marketing B2B, a orquestração talvez seja a mais silenciosa e nociva.
Enquanto IA, personalização e thought leadership dominam as conversas, o problema da fragmentação interna continua nas sombras das mesas de discussão.
Orquestração não é sobre fazer mais. É sobre fazer junto, com direção única, objetivos comuns e propósito claro. No entanto, a realidade em muitas empresas é outra: times atuando em silos, ações que não se conectam e decisões tomadas sem contexto.
Os sintomas são fáceis de reconhecer:
- Falta de consistência nas mensagens entregues em diferentes canais;
- Vendas abordam contas que o marketing já está nutrindo com outra narrativa;
- Iniciativas de marketing analisadas e reportadas isoladamente;
No fim, a marca aparece para o mercado como uma colcha de retalhos: cheia de ações, mas sem uma história consistente.
Para quebrar esse ciclo, a orquestração precisa se tornar um pilar estratégico do marketing. Isso significa:
- Construir uma narrativa central que guie todos os esforços da área, conectando conteúdo, mídia, eventos, relacionamento, CRM, produto e vendas;
- Alinhar rituais de planejamento e retrospectiva entre áreas, garantindo que todos conheçam a lógica por trás das decisões;
- Adotar KPIs compartilhados, que refletem o impacto conjunto, não apenas o desempenho de silos;
- Estabelecer a visão de resultados por conta, unificando os impactos das ações de MKT em um report único e estratégico que identifica a evolução da sua empresa (awareness, consideração e oportunidades) dentro de logos estratégicos.
Mais do que uma disciplina, orquestração é uma mentalidade. É reconhecer que a eficácia do marketing está diretamente ligada à sua capacidade de gerar coerência entre intenção, ação e percepção.
Sem isso, qualquer investimento em tecnologia, conteúdo ou mídia se dilui em um mar de esforços isolados.
O marketing que se conecta por dentro é o único que tem chance de se destacar por fora.
Conclusão: virar a página é escolher evoluir com intenção.
Virar a página, neste contexto, significa:
- Encarar a IA como uma aliada que exige domínio humano e não uma substituta criativa;
- Substituir a personalização superficial por conversas relevantes, direcionadas e orientadas por contexto;
- Assumir o protagonismo na narrativa do setor, com conteúdos que moldam opinião, não apenas repetem consenso;
- Trabalhar em uma operação de marketing que pensa, age e entrega valor de forma coordenada e coesa.
Nenhuma dessas transformações depende apenas de tecnologia. Elas dependem de visão, coragem, alinhamento interno e capacidade crítica.
O mercado está mais maduro. Os decisores mais seletivos. O conteúdo mais abundante. O que diferencia as marcas agora é a qualidade do pensamento por trás da execução.
O marketing B2B que lidera não será o mais barulhento nem o mais automatizado. Será o mais autêntico e intencional.